Após cinco anos longe, Brasil volta para casa e encontra uma cidade modificada. Governo peca no planejamento e vai oferecer serviços públicos deficientes
Por Chandy Teixeira, Tébaro Schmidt e Fernando MoraesTeresópolis, RJ
Seleção já está na Granja Comary (Foto: Gaspar Nóbrega/VIPCOMM)
A separação foi longa. Cinco anos. A última vez em que Teresópolis recebeu a Seleção foi na reta final das eliminatórias para a Copa do Mundo de 2010. De lá para cá, muita coisa mudou na cidade serrana. Uma tragédia ocorreu, três prefeitos governaram e uma crise política se instalou. No dia 12 de janeiro de 2011, Teresópolis acordou devastada pela chuva. Mais de 380 pessoas morreram e 71 ainda continuam desaparecidas, segundo o MP-RJ. Um prejuízo estimado em R$ 460 milhões. Agora, no caminho da reconstrução, aparecem o talento de Neymar e a união do escrete de Scolari. Receber a Seleção durante a preparação da Copa não só é um alento para a população que chorou nos últimos anos, mas também transforma Teresópolis na "capital" do Brasil.
Entretanto, esse status por pouco não foi arrancado da cidade. A imagem do ônibus da Seleção chegando cercado por seguranças e torcedores certamente gerou um tremendo alívio para o município que, há cerca de cinco anos, soube que perderia seu principal filho. Em 2009, a CBF anunciou que construiria um novo centro de treinamento para a equipe na Barra da Tijuca, na Zona Oeste do Rio de Janeiro, já pensando na Copa do Mundo. Teresópolis, então, iniciou uma força-tarefa para seduzir a entidade a desistir da ideia – campanhas foram divulgadas, como os adesivos nos ônibus, pedindo a volta da Seleção. Três anos depois, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) realmente desistiu, alegando irregularidades detectadas no terreno onde seriam feitos os campos na Barra.
Além de uma cidade profundamente modificada, a Seleção recebe uma Granja Comary modernizada por inteiro. O mesmo, porém, não se pode dizer sobre o restante do município. Ainda com as cicatrizes abertas da tragédia de 2011, o governo pecou na falta de obras em infraestrutura e vai oferecer um local com serviços deficientes para os turistas e jornalistas do mundo inteiro. Em setores capitais, como a rodoviária, por exemplo, a prefeitura admite falta de planejamento prévio e decidiu resolver o problema com uma maquiagem declarada.
Chegada da Seleção a Teresópolis (Foto: Leandro Canônico)
Os dois primeiros dias da Seleção na Granja foram reservados para exames e procedimentos médicos. O primeiro treinamento acontece somente na quarta-feira. Comandada por Luiz Felipe Scolari, o Brasil faz dois amistosos antes da estreia no Mundial: dia 3 de junho, contra Panamá, no Serra Dourada, em Goiânia; e contra a Sérvia, dia 6 de junho, no Morumbi. A equipe estreia na Copa contra a Croácia no dia 12 de junho, na Arena Corinthians, em São Paulo. Além do duelo com os europeus, encara na primeira fase o México, no dia 17, no Castelão, em Fortaleza; e Camarões, no dia 23, no Mané Garrincha, em Brasília.
O GloboEsporte.com preparou um resumo dos setores capitais da cidade que vai receber a Seleção para o mundial. Confira abaixo:
DECORAÇÃO DEZ, INFRAESTRUTURA ZERO
A cidade, definitivamente, não se preparou bem para receber o cometa chamado seleção brasileira. Na lista de investimentos da prefeitura, nenhuma menção a obras de expansão do setor viário, que é um calcanhar de Aquiles do município. Em horários de pico, o centro da cidade é tomado por grandes e demorados congestionamentos. A tendência para o período é piorar, visto que o setor hoteleiro da cidade serrana registra uma ocupação de 100%.
A prefeitura, em nota, informou que realizou o asfaltamento de ruas, entre elas a de acesso ao centro de treinamento da CBF, na Granja Comary, e de um trecho de 1.300 metros de extensão da Avenida Delfim Moreira, na Várzea, ambas já concluídas. Também teve início a remodelação da Praça Olímpica Luis de Camões, no centro da cidade, e da Praça Senta a Pua, no Soberbo, entrada da cidade, onde funciona o Centro de Informações Turística – sede da Secretaria Municipal de Turismo.
Prefeitura acertou na decoração, mas na infraestrutura... (Foto: Mowa Press)
A prefeitura também instalou sistemas de internet Wi-Fi em pontos estratégicos da cidade. A implantação foi concluída e está funcionando na Praça Higino da Silveira – a da Feirinha de Teresópolis, no Alto, bem como na Calçada da Fama e na Praça Blathasar da Silveira – a da Matriz de Santa Teresa, ambas no Centro. Entretanto, a conectividade, testada pela equipe de reportagem, é complicada.
Ainda de acordo com a lista enviada pela prefeitura de Teresópolis, a categoria de investimentos é preenchida apenas com gastos em decoração. Eles poderão ser vistos no movimento dos setores hoteleiro, gastronômico e comercial.
RODOVIÁRIA, UM CAOS
Trancas para lá de improvisadas nos banheiros da rodoviária (Foto: Reprodução InterTV RJ)
Visto que a cidade não possui aeroporto, grande parte dos turistas terá que passar pela rodoviária, que definitivamente deixa a desejar. Na verdade, há um consenso entre população, poder público e iniciativa privada de que o terminal rodoviário do município poderia ter recebido um tratamento melhor. As queixas não se limitam à típica ausência de informações, placas ou funcionários de prontidão - o que, diga-se de passagem, também acontece no local.
Inaugurado em 1971, a estrutura do Terminal Rodoviário Dedo de Deus recebeu apenas uma reforma de adaptação em 1995. De lá para cá, é exatamente o mesmo e não recebeu nenhuma grande obra para receber os visitantes no período de preparação da Seleção. Por isso, mesmo em uma caminhada rápida pelo local, é possível encontrar algumas rachaduras, infiltrações no teto e fios desencapados.
- Eu acho uma rodoviária bastante aquém do que Teresópolis merecia – acredita a aposentada Letizia Accorsia.
A limpeza do local é muito deficiente (Foto: Reprodução InterTV RJ)
No banheiro, mais problemas. A equipe de reportagem encontrou portas amarradas de maneira improvisada e falta de papel higiênico e papel toalha. Em um dos mictórios estava uma cesta de lixo. Vice-presidente do Convention Bureau da cidade, Fábio Costa Velho admite a situação longe da ideal.
- Faltou, lá atrás, um projeto que realmente focasse no turismo receptivo de Teresópolis, na revitalização dos pontos turísticos para que, nesse momento, a gente não estivesse vivendo esse problema - disse Fábio.
DANÇA DAS CADEIRAS NA PREFEITURA
Arlei Rosa, prefeito de Teresópolis, sofre com processos na justiça (Foto: Divulgação)
Desde a tragédia de 2011, a cidade vive um verdadeiro turbilhão político. Mário Jorge, prefeito na época das chuvas, foi cassado por mau uso de verba pública na contratação de um escritório de advocacia. Roberto Pinto, vice, assumiu, mas morreu dois dias depois. O então presidente da Câmara, Arlei Rosa, concluiu o mandato. Nas eleições de 2012, Mário Tricano (PP) foi o vencedor, superando Rosa (PMDB). No entanto, quem assumiu foi Arlei Rosa, pois Tricano teve o registro de candidatura indeferido pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
E a dança das cadeiras não para e pode ganhar mais um capítulo. Atual prefeito, Arlei Rosa pode perder o mandato por conta de uma acusação de abuso de poder econômico e de meios de comunicação na campanha de 2012. A ação é movida pelo candidato que terminou em terceiro colocado nas últimas eleições, Nilton Salomão (PT). O processo tramita na justiça ainda nas instâncias iniciais.
SEGURANÇA REFORÇADA
A chegada do ônibus com a comissão da seleção brasileira a Teresópolis já foi um exemplo de como funcionará o esquema de segurança na cidade enquanto o Brasil estiver nela. Veículos da Polícia Militar e Rodoviária Federal acompanharam todo o trajeto do coletivo, que também recebeu a escolta de um helicóptero. Nos últimos dias, o município recebeu um reforço de 98 militares. Desses, 58 se concentrarão apenas na área da Granja Comary, e os outros 40 trabalharão no Centro.
Além disso, Teresópolis também começou a abrir as portas para o apoio das forças de Segurança Federais e Estaduais e mais uma fração do Batalhão de Choque. Antes da chegada do escrete canarinho, 50 câmeras de monitoramento haviam sido instaladas em diversos pontos da cidade – seis delas com um alcance de 360º.
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